Nas discussões que se multiplicam nas redes sociais e em outras comunidades tecnológicas, é comum ver opiniões polarizadas sobre a suposta capacidade dos LLMs (Modelos de Linguagem de Grande Escala) de inovar ou extrapolar conhecimento. Mas é fundamental separar o que é criatividade genuína do que é, essencialmente, uma recombinação estatística de dados. Inovação não é sobre reconhecer padrões, é sobre transcender padrões.
Em ciência, extrapolar significa usar inferência lógica para ir além do que os dados mostram diretamente. Na criatividade humana, envolve algo ainda mais sofisticado: intuição, subjetividade e a habilidade de sintetizar conceitos distintos em algo verdadeiramente inédito. Isso exige mais do que correlações. Exige consciência, propósito e, muitas vezes, coragem intelectual.
Os LLMs, por sua vez, operam com base na arquitetura transformer, composta por dois mecanismos centrais. O primeiro é o mecanismo de atenção, que associa tokens a padrões aprendidos durante o treinamento. O segundo é o processo de decodificação estocástica, que insere variabilidade nas saídas por meio de técnicas como temperature scaling, permitindo gerar respostas linguísticas plausíveis, porém não reprodutíveis.
Essa combinação permite que os modelos produzam textos coerentes e, por vezes, surpreendentes. Mas, no fundo, são apenas rearranjos matematicamente guiados de conteúdos já vistos. Não há raciocínio, nem intenção. O que parece ser “criatividade” é, na verdade, uma simulação de originalidade a partir de fragmentos existentes.
Técnicas como chain-of-thought ou tree-of-thought são frequentemente citadas como sinais de raciocínio. No entanto, o que fazem é apenas dividir uma tarefa complexa em passos mais simples, algo que melhora a performance, mas não confere ao modelo nenhuma forma real de compreensão ou abstração. O LLM não cria conceitos. Ele reorganiza memórias estatísticas.
Essa limitação torna-se evidente na não reprodutibilidade das respostas. Diante da mesma entrada, o modelo pode retornar saídas diferentes a cada execução. Ao contrário de um pesquisador humano, que pode validar hipóteses com consistência metodológica, um LLM carece de qualquer estrutura epistemológica. Ele não “aprende” com erros nem desenvolve pensamento crítico.
Mesmo com trilhões de parâmetros, esses modelos continuam operando sob os limites do que foi visto, sem capacidade de questionar suposições, propor paradigmas ou desafiar o status quo. E é justamente essa habilidade de ruptura que define a inovação real. Um doutorando, por exemplo, não apenas analisa dados: ele questiona metodologias, propõe novos caminhos e lida com a incerteza de forma criativa.
Os LLMs, por outro lado, são ferramentas estatísticas de alta performance. Excelentes para tarefas como tradução, resumo ou apoio à escrita. Mas não são parceiros intelectuais. Confundir sua utilidade com verdadeira cognição é um erro conceitual que precisamos evitar.
Reconhecer suas limitações não é desprezá-los, é colocá-los no lugar certo. LLMs são extensões de nossa capacidade de processar linguagem, não substitutos para nosso pensamento criativo. A IA Generativa deve ser usada com discernimento: como ferramenta, não como mente.
Para se aprofundar tecnicamente no funcionamento dos LLMs, recomendo a leitura do Deep Learning Book Brasil.
David Matos